Revista Infra Maio/Junho 2018

91 INFRA Outsourcing & Workplace em relação às soluções tradicionais de fossas cavadas em que a água negra é totalmente absorvida pelo terreno vin- do a contaminar cursos d´água e onde este esgoto, correndo a céu aberto, pro- voca inúmeras patogenias que levam a casos de hepatite e diarréia, doenças frequentes nessas regiões. Você mencionou a execução de um projeto piloto, certo? Como foi? O piloto foi feito dentro da Associação Comunitária que fica na área do Insti- tuto Anchieta Grajaú. Escolhemos esse local pelo apoio que já temos do Insti- tuto e por ele ter um curso de formação de mestres de obra em parceria com o SENAI de São Paulo. Aliás, foi a primeira turma de mestres de obra formada lá que foi convocada, aceitou e abraçou a idéia de implantar o biodigestor. Ao idealizar o projeto, procuramos quebrar o paradigma de que é necessário um grande sistema de tratamento de es- goto, com criação de redes etc. Nosso plano é replicar inúmeras vezes a in- fraestrutura que implantamos, atenden- do três famílias a cada vez, ou seja, fazer uma série de pequenos tratamentos locais em contraponto aos grandes, ca- ros e demorados sistemas tradicionais. Por esta razão, o piloto já foi realizado na escala que será replicada para ou- tras famílias, está em funcionamento e começará a gerar gás em cerca de um mês e meio que é o tempo que o lodo leva naturalmente para se formar. Como foi a reação dos envolvidos nes- te processo, digo, a comunidade aten- dida, as pessoas que trabalharam na execução e os apoiadores do Projeto? A reação tem sido amelhor possível por- que o esgoto é um dos problemas mais graves que as populações carentes têm no dia a dia. Ele atrai bichos, provoca doenças, é moralmente degradante e humilhante. Além disso, os moradores desses locais vêem como uma situa- ção excepcional, uma pessoa de fora do Instituto Grajaú Anchieta se interessar e se dedicar a fazer algo por eles, pois, alémdo IAG, cuja presença é constante, só o TETO tinha estado lá. Por outro lado, os apoiadores também estãomui- to satisfeitos com os resultados que já conseguimos por entenderem que saneamento é um passivo do Brasil, país em que metade da população não tem acesso a esgoto tratado. Onde implantamos o piloto e para onde pretendemos expandir, sãocomunidades extremamentedesassistidas, aquelas que estão entregues à própria sorte pela au- sênciade atuaçãodaUnião. Nesseponto, preciso fazer uma ressalva e comentar que entendo que nem sempre o Estado poderia intervir porque algumas regiões são áreas de proteção ambiental, beiras de represas, entorno de baias (como a Baía de Guanabara) etc, locais em que nenhuma comunidade deveria estar fi- xada. Aquestão é que se o assentamento não foi impedido e as condições básicas não foramprovidas, os efeitos negativos estãopresentes e, como resultado, temos esgoto in natura despejado seja na Baía de Guanabara, nas represas Billings e Guarapirangaouemqualquer outro local. O Biosaneamento é uma iniciativa que, mesmo encarada como ‘paliativa’, tem um grande potencial de diminuição da poluição em cursos d´água ou em re- presas, alémdamelhoria das condições sanitárias da população. Sempre que você faz men- ção à execução do Projeto, você usa o “nós”. Quem está envolvido nele? Estamos criando uma associação sem fins lucrativos em que os participantes atuam de forma pró-bono, doando seu tempo e seu expertise de diversas formas, mas com o único objetivo de criar meios para que esta iniciativa se expanda exponencialmente. Já con- tamos com o apoio de engenheiros, advogados, sanitaristas, ONGs, entre outros, mas qualquer adesão que ve- nha a somar esforços com os nossos é muito bem-vinda. É preciso ter uma estrutura própria, bem organizada, que permita uma auditoria feita por órgãos competentes de forma a dar credibilidade e robustez ao que esta- mos propondo, trazer transparência de destinação de recursos dos inves- tidores e servir como referência para mais ações sociais. Você falou de investidores… e quais são os próximos passos? Sim. O piloto foi financiado pela Cons- trutora KLAR, empresa da qual sou sócio, em parceria com o Instituto Anchieta Grajaú e a Universidade de Michigan. Para a expansão, nosso alvo é apresentar o projeto para grandes empresas que já tenham uma verba destinada a investimento em respon- sabilidade social. O próximo passo é aproveitar a expe- riência do piloto para consolidar o custo da implantação da primeira bateria de biodigestores.

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